O que foi feito de pior, em termos de saúde pública, durante a pandemia
Por Paulo Portinho
A politização da ciência médica.
A publicação(1) recente, no European Journal of Epidemiology – publicação com fator de impacto superior a doze(2) -, de uma meta-análise de 7 estudos randomizados sobre profilaxia contra COVID, mostrou que a hidroxicloroquina, remédio cujo nome esteve proibido em redes sociais desde meados da pandemia, teria reduzido o risco de contrair a doença em 28%.
O estudo, mais do que mostrar, com uma meta-análise bem feita, que o remédio obteve evidências científicas positivas e robustas, critica o papel de quem preferiu politizar, ridicularizar e perseguir médicos e pesquisadores que indicavam resultados positivos para remédios reposicionados, o que dificultou inclusive que estudos já em andamento, grandes e financiados, pudessem ser concluídos.
Mas a politização excessiva da ciência não foi a pior ação de saúde pública.
A subversão da lógica da imunologia
Subvertemos algumas lógicas e entendimentos pacificados em saúde pública. Uma dessas subversões foi considerar que o efeito protetor da vacinação seria superior ao efeito protetor imunológico que a própria infecção viral causou nas pessoas que já tinham contraído a doença. É fácil encontrar vídeos antigos do Dr. Fauci, o vaidoso, falando abertamente da superioridade da proteção conferida pela infecção natural. Ainda que ele de fato acredite que as coisas mudaram, não houve tempo e muito menos estudos suficientes para embasar mudança tão radical de posicionamento científico.
Quando as vacinas saíram, já havia dezenas, talvez centenas de milhões de pessoas com infecção prévia, muitas ainda com elevada presença de anticorpos neutralizantes. O racional, considerando tudo o que sempre se soube, seria, no mínimo, priorizar a vacinação de quem ainda não teve contato com o vírus.
Mas esse foi outro debate brutalmente esmagado na academia, na sociedade médica e nas redes sociais. Quem se atrevesse a sugerir que a infecção natural poderia desempenhar um papel importante na prevenção e no combate à pandemia, era sumariamente calado. Aliás, mesmo quando saiu um estudo indicando que não vacinados previamente infectados poderiam ter mais proteção do que vacinados, o debate continuou sonegado(3).
Mas a subversão de entendimentos pacificados em imunologia não foi a pior ação de saúde pública.
A criminalização da prática médica
Outra lógica básica foi subvertida. Quando há uma doença complexa e sistêmica, algo novo e pouco estudado, e potencialmente fatal, a lógica básica sempre foi procurar médicos experientes, que já trataram centenas ou milhares de pacientes, e conhecem o curso da doença, não de forma genérica ou padronizada, mas de forma sistêmica e individualizada.
Estudos científicos tratam as diferenças entre pacientes como números inertes, que serão avaliados em uma ferramenta estatística que vai “normalizar” essas diferenças. Médicos reais, com pacientes reais, tratam cada diferença nos quadros clínicos e sub-clínicos de seus pacientes de forma customizada. Justamente por isso, existem médicos muito melhores do que outros, capazes de concatenar conhecimento e experiência. Coisa normal, em qualquer profissão.
Até antes da pandemia praticamente todas as pessoas procurariam o médico mais indicado para seus quadros clínicos (se pudessem pagar), pois não só seriam os mais estudiosos, como os que desenvolveram a maior expertise prática. Seriam os que melhor conhecem o fluxo da doença e as intervenções que podem funcionar para deter sua propagação ou reduzir os danos.
Com a COVID, praticamente todos os médicos, por melhor que fossem seus currículos, que se apresentavam para tratar precocemente e fora do hospital um paciente com a doença, eram tratados como charlatães e sofriam perseguições pessoais, institucionais e profissionais.
Foram poupados apenas os médicos de protocolo, que são principalmente aqueles que atuavam dentro de hospitais, seguindo exclusivamente um algoritmo que os isentava de risco legal, ou aqueles profissionais que, recebendo pacientes fora do hospital para tratamento precoce, negavam qualquer procedimento ou tratamento, indicando apenas analgésicos e antitérmicos. Nada contra esses médicos, fizeram o papel deles, mas há muito contra os que atacaram seus colegas e tentaram impedir as pessoas de procurar ajuda fora do “protocolo”.
Isso representa algo bastante perigoso para a comunidade médica. Para seguir um algoritmo não é muito relevante ter expertise e, se não é relevante a expertise, um jovem recém-formado obediente pode funcionar, ou pior, um software poderia, eventualmente, substituir o médico para a maioria dos casos. Será que é o futuro?
Mas a criminalização do médico experiente não foi a pior ação de saúde pública (apesar de passar perto…)
A orientação para só ir ao medico quando sentir falta de ar e o desconhecimento sobre o tratamento precoce.
O pior de todos os erros, e o que seguramente mais colocou as pessoas em risco, foi o protocolo “só vá ao médico/hospital com falta de ar”.
Para quem estudou a fundo a doença, sendo médico ou apenas um cidadão querendo se proteger, desde o início ficou claro que a COVID trazia um quadro novo sobre hipóxia (baixa oxigenação). Normalmente uma baixa na oxigenação vem rapidamente acompanhada por sentimento de falta de ar, mas na COVID as pessoas chegavam a níveis baixíssimos sem sentir falta de ar (foi chamado de happy hypoxia(4)).
Desse modo, 100% dos médicos que estudaram a doença naqueles primeiros 12 meses, sabiam que quando o sintoma clínico se transforma em falta de ar, muito provavelmente a oxigenação já está baixa a um nível difícil de reverter, dado o comprometimento vascular dos pulmões.
Foi a situação mais inacreditável, mas as autoridades de saúde justificavam o protocolo por entender que não havia tratamento precoce, portanto não havia o que fazer, apenas gerenciar espaço em hospitais.
O pior, é que o tratamento precoce existia, era eficiente e já estava sendo amplamente utilizado pelos médicos que desenvolveram expertise sobre a doença, e também dentro dos melhores hospitais do país. Não se tratava apenas de remédios reposicionados, mas, sobretudo, de atenção individualizada ao paciente ANTES de se tornar inviável trata-lo.
Em estudo(5) publicado ainda em março 2021, ficou evidenciado que a mortalidade em UTIs de hospitais privados era quase a metade da encontrada em hospitais públicos (29,7% a 52,9%), e esse estudo, sem querer e de forma despercebida, demonstrava o quão importante era, não o hospital em si, mas o atendimento e tratamento precoces. No meio do estudo a conclusão foi de que o principal motivo da diferença na mortalidade “é o fato de que os doentes chegam aos hospitais públicos em condições piores. Entre os internados da rede privada, 39,4% dos pacientes requerem intubação. No caso da rede pública, são 63,2%”.
Quem tem parentes ou amigos de renda mais alta, sabe que nos hospitais de alto custo, como Einstein e Sírio, utilizou-se amplamente a internação preventiva, principalmente para grupos de risco. Alguns políticos e empresários, como o José Serra e o Sílvio Santos, mesmo vacinados com boosters (reforços), foram internados preventivamente.
Se a questão “tempo” foi fundamental, é razoável afirmar que quanto antes houver intervenção, melhor.
O que os estudos mostram, considerando que não há remédio “bala de prata”, e esquecendo os reposicionados controversos, é que, ao atacar os remédios, jogou-se fora o próprio tratamento precoce, que é muito mais do que comprimidos salvadores, mas monitoramento de sinais clínicos e subclínicos, indicando ou não intervenção com remédios que seriam usados nos hospitais se a pessoa estivesse sob cuidados médicos, como anti-coagulantes e corticoides.
Conclusão
Os hospitais sabiam o que fazer, os médicos sabiam o que fazer, mas dependendo do estado em que chegava o paciente, salvá-lo era quase impossível. E isso fica ainda mais claro quando aparecem números(6) de mortalidade dos hospitais mais caros, quase metade dos outros da rede privada.
Os protocolos são similares, e não havia remédio milagroso para enfrentar a doença, portanto o que foi feito dentro dos hospitais privados e públicos era semelhante, com os mesmos fármacos. O problema é que nos hospitais públicos esperava-se um milagre para salvar pessoas que chegavam após 10, 15 dias de sintomas, sem qualquer acompanhamento prévio ou intervenção assistida, com 50% de oxigenação. Só milagre mesmo.
Isso tudo seria minimizado se não se tivesse politizado a saúde pública, o que obliterou todo o conhecimento de séculos de medicina preventiva e de décadas de ciência epidemiológica. E também obliterou 300 anos de filosofia e democracia liberal, pois se permitiu ao estado, e às pessoas comuns, agirem como déspotas, negando até mesmo o direito básico de acreditar que se deve procurar um médico imediatamente, quando sente-se sintomas de uma doença potencialmente fatal.
Isso foi o principal erro brasileiro, e disparado o que mais matou na pandemia. Foi o pior por que reuniu tudo de errado que foi base dos outros erros e manteve pessoas em casa até praticamente ser inviável trata-las. E sabia-se disso, qualquer médico minimamente informado sabia da happy hypoxia.
Triste demais. Só resta esperar e torcer para que não se repita.
1 https://link.springer.com/article/10.1007/s10654-022-00891-4
2 https://www.springer.com/journal/10654
E, em nosso país, a esquerda optou em criminalizar o uso do HCQ e do AZT com o único e firme propósito de aumentar as mortes para tentar imputar ao presidente Bolsonaro a culpa de toda a desgraça.
Em 2021 vi um post no Instagram que dizia: “A maior vítima da pandemia foi o intelecto humano.” Foi surreal o que aconteceu em 2020 aqui e no mundo. O medo tem um poder incrível de deixar as pessoas mais burras. Amedronte a população e abra espaço um governo global controlar tudo e todos.